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EMPREITEIRAS LUCRAVAM TRÊS A QUATRO VEZES O VALOR DA PROPINA

Mônica Bergamo
Folha
Um ano depois da deflagração da Lava Jato, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima diz que a operação “andou num ritmo muito mais rápido do que o que nós estávamos acostumados a trabalhar”. No entanto, acredita que as investigações estão apenas “arranhando o verniz de uma estrutura muito maior”, que seria a forma como se financia a política no país.
Santos Lima defende mudanças profundas no sistema político e afirma que esquemas de corrupção, como o que agora é revelado na Petrobras, fazem parte de uma engrenagem que funciona como um relógio gigantesco. “Pode até perder algumas peças, que são substituídas por outras. Mas funciona até independente da vontade dessas peças”.
Aos 50 anos, Santos Lima fez parte da força-tarefa que investigou o escândalo do Banestado, na década de 90, o primeiro a usar em larga escala a delação premiada como forma de investigação. Na semana passada, ele recebeu a Folha para uma entrevista exclusiva. A conversa foi acompanhada, em alguns momentos, pelo procurador Deltan Dallagnol, coordenador da Força Tarefa que investiga o escândalo.
Segundo o procurador, quem mais ganhava com a corrupção na Petrobras eram as empreiteiras. “O esquema gerava um lucro para elas que deveria ser três ou quatro vezes o custo da propina.”
FOLHA – O Brasil vive um momento de polarização política. Uma parte do país pressiona o Ministério Público, “tem que pegar a presidente Dilma Rousseff e tem que pegar o Lula”. Uma outra parte que diz que vocês estão conduzindo as investigações só para incriminar os dois. Existe alguma suspeita sobre a presidente da República, com o que vocês já conhecem? E até que ponto, existindo ou não essa suspeita, esse clima interfere e conturba a investigação?

SANTOS LIMA A primeira questão é delicada. Todos os casos que nós investigarmos estarão dentro da nossa atribuição. Quando surge alguém que tem foro privilegiado [direito de ser julgado em cortes superiores por ocupar cargo público, como presidente, governadores e parlamentares], nós imediatamente chamamos a equipe da PGR (Procuradoria-Geral da República, que pode denunciar autoridades com foro). Então nós não colocamos a mão nesta cumbuca. Em segundo lugar, não existe escolha [de quem deve ser investigado]. Nós somos procuradores da República. Nós temos um modo de pensar muito peculiar: cometeu erro, não importa quem seja a pessoa. Vamos fazer o que tem que ser feito. Nós não fazemos essa distinção [política].
Agora, evidentemente esse ambiente polarizado dificulta bastante o nosso trabalho e facilita bastante o trabalho dos acusados. Por quê? Porque eles usam o ambiente polarizado para nos imputar uma atuação política que nós não temos nem podemos ter. Claro que todas as pessoas têm a sua orientação política, isso independe. Mas, no trabalho, nossa esquipe é bastante heterogênea e não existe nenhuma orientação. As pessoas parecem não compreender aquela frase que o [procurador-geral Rodrigo] Janot falou na sabatina [do Senado, quando foi indicado para o cargo, em 2013]: “Pau que dá em Francisco, dá em Chico”. Essa deve ser a regra do Ministério Público realmente. Não faz a menor diferença se for A ou se for fulano B.
FOLHA – Vocês não elegem uma caça?

SANTOS LIMA  Não. É claro, se eu olho o momento em que eu estou fazendo a investigação, como um investigador federal – e, portanto, para mim o que interessam são os crimes federais –, e eu olho o tempo de poder exercido por um partido e por outro, eu obviamente tenho pessoas mais ligadas a uma tendência [política] do que de outra [envolvidas no escândalo]. Mas isso não é uma escolha minha. São os fatos. E os fatos muito antigos prescrevem. Eu não vou perder dinheiro público investigando fatos que estão prescritos [que teriam ocorrido em governos anteriores].

DALLAGNOL – Nem pode. Existe um impedimento legal de se investigar fatos prescritos.

SANTOS LIMA – Então tecnicamente a questão é muito simples. Mas realmente o ambiente polarizado do país nos prejudica muito. Ninguém quer aqui ser hostilizado nem virar herói. Só quer fazer o seu trabalho e ir para casa. Essa a nossa posição.

FOLHA – Há contradição entre os depoimentos do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa, e do doleiro Alberto Yousseff. O primeiro diz que autorizou, via Yousseff, o envio de recursos do esquema da Petrobras a Antonio Palocci, que os destinaria à campanha presidencial de Dilma Rousseff. O doleiro nega. Vocês admitem que pode haver mentiras nas delações?


DALLAGNOL – Se você colher o depoimento de uma testemunha por dez vezes, de uma pessoa correta, quanto mais colher o depoimento, mais ela vai entrar em contradições. Depoimentos de dez testemunhas isentas serão dez perspectivas sobre o mesmo fato. Nos EUA, eles dizem: “As diferenças aumentam o valor do que os depoimentos têm em comum. Porque elas mostram que não existiu um ajuste, um prévio acordo [entre os delatores].

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